Avanços e desafios após rompimento da Barragem de Fundão

Seg, 05 de Novembro de 2018 15:35

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Fotos: Janice Drumond

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Diversas ações de recuperação já foram realizadas desde o rompimento da barragem de Fundão

 

Muitos foram os passos dados em Minas Gerais para tornar a gestão da atividade de mineração mais sustentável no Estado desde o rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas. Nesta segunda-feira, 5 de novembro, quando o acidente completa 3 anos, o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) acumula uma série de aprendizados e desafios na gestão das barragens de rejeitos e nas ações de recuperação da bacia do Rio Doce.

 

Todo o trabalho teve início logo nas primeiras horas após o rompimento da Barragem de Fundão com o atendimento prestado pelo Núcleo de Emergência Ambiental (NEA/Semad) e continua até hoje por meio do envolvimento de dirigentes e de uma equipe multidisciplinar de cerca de 40 técnicos que participam efetivamente da discussão dos programas, visando a reparação e a compensação dos danos ambientais causados, previstos no Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) firmado pela Samarco Mineração e suas acionistas.

 

Após um amplo processo de discussão na Força Tarefa criada em 2016, houve uma importante mudança na legislação estadual afeta à gestão das barragens de rejeitos, com a publicação do Decreto 46.993/2016, que proíbe a aplicação da tecnologia de alteamento a montante, como era feito na Barragem de Fundão. Em caráter complementar, foi publicada também a Resolução Conjunta Semad/Feam nº 2.372/2016, que criou a obrigatoriedade da Auditoria Técnica Extraordinária de Segurança para barragens existentes com este tipo de alteamento, com foco na análise do potencial de ocorrência do fenômeno de liquefação, como medida preventiva para novos desastres. A Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) vem acompanhando desde então os resultados destas auditorias e ampliou em 50 % as ações de fiscalização ambiental nas barragens de rejeitos em Minas Gerais.

 

Em 2017, foram realizadas capacitações de servidores do Sisema e também de outras secretarias do Estado para que fossem iniciadas fiscalizações conjuntas com a Feam em barragens de rejeitos e de resíduos.

 

FISCALIZAÇÃO

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As ações de fiscalização foram ampliadas em 50% desde o rompimento da barragem de Fundão

 

A fiscalização da segurança de barragens é responsabilidade da Agência Nacional de Mineração (ANM), antigo DNPM, entidade que concede a outorga de direitos minerários para fins de pesquisa e lavra para o aproveitamento mineral.

 

No âmbito do Sisema, a Feam desenvolve o Programa Gestão de Barragens, que tem por objetivo promover o controle ambiental dessas estruturas, a partir da classificação quanto ao potencial de dano ambiental e da atualização sistemática das informações relativas às auditorias de segurança, visando à minimização da probabilidade da ocorrência de acidentes com impactos ambientais. A responsabilidade pela operação adequada das estruturas é do empreendedor e as auditorias devem ser realizadas por profissional especialista em segurança de barragens, externo aos quadros das empresas.

 

A Feam estabelece anualmente um cronograma de fiscalizações em barragens de rejeitos e resíduos a fim de verificar o cumprimento das recomendações apontadas nas auditorias de segurança. De 200 fiscalizações anuais registradas em 2015, o número chegou a 300 por ano, em 2017 e 2018.

 

Essas fiscalizações priorizaram as barragens que não tiveram as declarações de condição de estabilidade apresentadas na periodicidade correta, as estruturas consideradas com alto potencial de dano ambiental, aquelas onde o auditor não atestou pela estabilidade e onde a auditoria foi inconclusa devido à falta de dados ou documentos técnicos.

 

Barragens que foram alvos de denúncias, estruturas que solicitaram descaracterização, novas barragens inseridas no Banco de Declarações Ambientais (BDA) e solicitações feitas por meio de Ações Civis do Ministério Público Federal (MPF) também são objeto de fiscalização pela Feam.

 

Além das fiscalizações nas barragens do estado, de novembro de 2016 a julho de 2018 foram realizadas seis campanhas de fiscalização da Operação denominada “Watu”. O Objetivo dessas fiscalizações é monitorar o andamento da recuperação ambiental nas áreas afetadas entre Mariana e a Usina Hidrelétrica Risoleta Neves, em Rio Doce. A última operação foi realizada no período de 03 a 06 de julho de 2018, identificando áreas onde a recuperação apresenta sucesso, mas também apontando problemas diversos. As vistorias são realizadas em parceria com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e, eventualmente, participam também técnicos do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (IEMA/ES). O resultado as operações são reportados à Fundação Renova para correção ou redefinição de ações.

 

PARCERIAS INTERNACIONAIS

 

O Governo de Minas, por meio do Sisema, estabeleceu parcerias internacionais para aquisição de novas tecnologias, bem como tem ampliado o fomento a alternativas para gestão de rejeitos de mineração. O Sisema incentiva empresas a adotar novas tecnologias para monitoramento de suas estruturas, avaliando alternativas que foram discutidas com diversos setores durante o I Seminário Internacional de Barragens, realizado em Belo Horizonte, em janeiro de 2018.

 

No encontro, foram compartilhadas experiências trazidas da Holanda. Uma comitiva do Sisema viajou também para a China neste ano para conhecer novas técnicas de reaproveitamento de rejeitos, que serão apresentadas durante o II Seminário Internacional de Barragens, previsto para dezembro.

 

RECUPERAÇÃO DA BACIA DO RIO DOCE

 

A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) vem coordenando ações integradas das equipes técnicas da Secretaria, da Feam, do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) e do Instituto Estadual de Florestas (IEF) para otimizar o acompanhamento dos 42 programas de recuperação ambiental, social e econômico da Bacia do rio Doce previstos no TTAC firmado.

 

Desde maio/2016 a Semad integra o Comitê Interfederativo (CIF), sistema de governança estabelecido para acompanhamento das medidas de mitigação e compensação dos impactos do desastre. Os técnicos do Sisema integram nove das 11 Câmaras Técnicas do CIF, responsáveis por discutir e definir as diretrizes técnicas para execução dos 42 programas previstos no TTAC.

 

Com o objetivo de aprimorar a articulação institucional e o acompanhamento das ações de recuperação, em janeiro de 2017 o Governo de Minas criou na Semad, por meio do Decreto Estadual no 47.134, a Diretoria de Gestão da Bacia do Rio Doce, vinculada à Superintendência de Gestão Ambiental.

 

Atualmente esta diretoria coordena a Câmara Técnica de Gestão de Rejeitos e Segurança Ambiental (CT-GRSA) do CIF, onde são discutidos junto com a Fundação Renova as alternativas de manejo para as áreas onde ocorreu deposição dos rejeitos, apontando a retirada ou permanência de material, com projetos de recuperação ambiental para cada área, que incluem projetos e estudos detalhados.

 

A Feam integra a CT-GRSA e está responsável, dentre outras ações, pelos estudos de Análise de Risco à Saúde Humana que estão sendo elaborados pela Fundação Renova, visando avaliar se existe contaminação nos compartimentos ambientais afetados (solo, água e sedimentos) que possam causar risco para a saúde da população, de forma articulada com a Secretaria Estadual de Saúde.

 

A Feam também faz o acompanhamento de todas as medidas adotadas pela Samarco referentes à estabilidade das estruturas de contenção de rejeitos já existentes ou construídas após o rompimento da Barragem de Fundão - barragem de Germano, Nova Santarém, diques S3 e S4 e Eixo 1. Estas estruturas passam por auditoria técnica de segurança independente contratada pelo Ministério Público Estadual, que atesta a estabilidade geotécnica das mesmas.

 

A cargo do Igam está a coordenação da Câmara Técnica de Segurança Hídrica e Qualidade da Água (CT-SHQA) do CIF, responsável, dentre outras ações, pelo acompanhamento do Programa de Monitoramento Quali-Quantitativo das Águas e dos Sedimentos no Rio Doce e zona costeira e marinha (PMQQS) executado pela Fundação Renova, para permitir a identificação de anomalias, variações e tendências dos parâmetros de qualidade das águas dos rios afetados pelo desastre e das regiões da foz e litoral.

 

Existem 92 estações de monitoramento da qualidade das águas superficiais distribuídas ao longo da bacia, sendo 56 estações ao longo do rio Doce e zona costeira e 14 estações de monitoramento em lagoas do Espírito Santo nos estuários capixabas e a zona costeira, com avaliação de 42 parâmetros físico-químicos.

 

Também são realizados o biomonitoramento, ensaios ecotoxicológicos e medição de vazão e descarga líquida e sólida. Esta rede conta também com 22 estações de monitoramento automático em tempo real, composto por estrutura fixa no local de medição, onde são instalados equipamentos para medição do nível do rio, bem como sensores para a medição contínua de parâmetros de qualidade da água e dados meteorológicos.

 

Na CT-SHQA também são definidos os critérios para aplicação dos 500 milhões de reais previstos no TTAC em obras de saneamento - tratamento de esgotos sanitários e gestão de resíduos sólidos urbanos -, como medida compensatória aos impactos na bacia. A Feam participa desta ação e trabalha em articulação com a Secretaria de Cidades e Integração Regional (Secir).

 

O IEF participa da Câmara Técnica de Restauração Florestal e Produção de Água (CT-Flor) do CIF, que é responsável pela definição de diretrizes para a recuperação de 40.000 ha de vegetação ao longo da bacia do rio Doce, que tem interfaces com os Programas de Retomada das Atividades Agropecuárias e de Fomento ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), bem como com as ações que já vem sendo executadas pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do rio Doce.

 

A Semad, em articulação com a Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa) tem apoiado o uso do Zoneamento Ambiental e Produtivo - ZAP (metodologia estadual) como ferramenta de planejamento da restauração florestal, sendo que a Fundação Renova contratou a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater) para realizar seis estudos para toda a bacia do Rio Gualaxo do Norte.

 

O IEF também integra a Câmara Técnica de Proteção à Biodiversidade (CT-Bio) do CIF, na qual são definidos os critérios para monitoramento da fauna e flora nas áreas impactadas, incluindo as medidas de restrição à pesca.

 

Em relação à regularização ambiental das ações voltadas à recuperação dos danos causados pelo desastre, a Semad e seus órgãos vinculados têm dado suporte técnico na avaliação e definição de diretrizes para a reconstrução das estruturas afetadas nos municípios de Barra Longa e Rio Doce,

 

incluindo as obras de recuperação da Usina Hidrelétrica Risoleta Neves/Candonga, indicando os requisitos para licenciamento ambiental, outorga de uso de recursos hídricos ou autorização de supressão vegetal, quando aplicáveis.

 

A equipe da Semad realizou estudos de Avaliação Ambiental Preliminar e várias vistorias nas áreas anfitriãs das comunidades de Nova Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Gesteira, a fim de subsidiar a tomada de decisão quanto aos melhores desenhos urbanos para os reassentamentos. Em julho de 2018 a Semad concedeu licença ambiental para construção do novo distrito de Bento Rodrigues e reassentamento das famílias atingidas pelo rompimento de Fundão.

 

RETOMADA DAS ATIVIDADES DA SAMARCO

 

A Semad emitiu, em dezembro de 2017, a Licença Prévia (LP) e a Licença de Instalação (LI) do Sistema de Disposição de Rejeitos (SDR) Cava Alegria Sul, da Samarco, em Mariana.

 

A licença concedida permite a preparação do SDR para receber, no futuro, os rejeitos de mineração da empresa. Essa licença, única em vigência, não permite a retomada das atividades produtivas.

 

A Licença de Operação (LO), no entanto, que autoriza o início das atividades do SDR, será analisada posteriormente, após a conclusão das obras, em 2019. A obra está sendo realizada pela empresa.

 

A Licença de Operação Corretiva para o Complexo Minerário de Germano encontra-se em análise na Secretaria, mas a expectativa é que seja concluída em concomitância com a análise da LO do SDR.

 

A empresa precisa da aprovação da referida LOC para retomar as atividades. A previsão de finalização da análise técnica e deliberação pela Câmara de Atividades Minerárias (CMI) do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) é para o primeiro semestre de 2019.

 

DESAFIOS

 

Nestes três anos de trabalho intenso o Sisema já colheu grandes aprendizados na gestão ambiental dos graves impactos ambientais decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, em especial pela necessidade de constante articulação com os entes públicos federais e municipais que participam deste inovador sistema de governança.

 

A assinatura e homologação, em maio de 2018, do novo TAC Governança que incluiu no sistema CIF os Ministérios Públicos Federal e Estaduais de Minas Gerais e Espírito Santo, as Defensorias Públicas e representantes dos atingidos, significa uma nova etapa nos cenários de tomada de decisão, na busca de melhorar a aproximação das ações de recuperação da bacia do Rio Doce aos anseios das comunidades locais.

 

Diante de tantas informações, relatórios e estudos já gerados, como aponta recente relatório do Painel Rio Doce da União Internacional para Conservação da Natureza - UICN, estamos conseguindo identificar melhor os efeitos agudos e imediatos da dispersão de rejeitos, mas não é fácil diferenciar seus efeitos crônicos e de longo prazo. Entender as consequências do rompimento da Barragem de Fundão no contexto das escalas espacial, temporal e social ainda é um grande desafio, pois requer um processo contínuo de geração de conhecimento e compreensão dos impactos, considerando que as informações de base sobre a bacia antes do desastre são limitadas e fragmentadas.

 

Nesse sentido o apoio à continuidade das ações de acompanhamento realizadas pelo Sisema mostra-se fundamental para a efetividade da recuperação da bacia do Rio Doce.

 

Belo Horizonte, 05 de novembro de 2018.